Após mais de 54 anos, a Convenção de Eliminação da Exigência de Legalização de Documentos Públicos Estrangeiros, firmada em Haia, em 5 de outubro de 1961, foi finalmente internalizada no ordenamento jurídico brasileiro, com a publicação em 29 de janeiro de 2016 do Decreto nº8.660, subsequentemente à adesão do Brasil depositada no Ministério das Relações Exteriores Holandês em 2 de dezembro de 2015.
A Convenção sobre supressão da exigência de legalização de documentos públicos estrangeiros, também conhecida como a Convenção da Apostila, é uma das mais antigas e mais utilizadas das convenções elaboradas pela Conferência da Haia, possuindo atualmente 109 Estados Signatários, dentre os quais destacam-se os Estados-Unidos, a China, o Japão, a Alemanha, o Reino-Unido, a França, a Índia e a Itália.
Esta Convenção busca facilitar a circulação de documentos públicos de um Estado a outro, estabelecendo um sistema simples, com uma única verificação (na origem), da qual resulta a adição de uma apostila ao documento (“Apostille”). Desta forma, documentos oriundos dos Estados-Partes signatários da Convenção estão dispensados da exigência de legalização diplomática ou consular para que tenham validade e produzam efeitos nos demais Estados-Partes. Tais procedimentos de legalização são substituídos pela aposição da chamada “Apostille”, contribuindo com a significativa diminuição de tempo e custo do processo de legalização.
A apostila é similar à autenticação de uma cópia ou ao reconhecimento de uma firma, limita-se, portanto, a certificar que a firma ou o selo exibido no documento foi emitido por um funcionário público no exercício de suas funções, porém não reconhece a validade do conteúdo do documento.
Por outro lado, para evitar fraudes, a Convenção criou um registro da autoridade competente, que pode fornecer informações aos interessados sobre o documento que foi apostilado.
De acordo com o Artigo 1º da Convenção, sua aplicação abrange os a) documentos provenientes de uma autoridade ou de um agente público vinculados a qualquer jurisdição do Estado, inclusive os documentos provenientes do Ministério Público, de escrivão judiciário ou de oficial de justiça; b) documentos administrativos; c) atos notariais; e d) declarações oficiais apostas em documentos de natureza privada, tais como certidões que comprovem o registro de um documento ou a sua existência em determinada data, e reconhecimentos de assinatura.
Portanto, a Convenção aplica-se também aos documentos privados certificados ou reconhecidos por notários. Dado às características do sistema jurídico brasileiro, a adoção da apostila será muito útil, por exemplo, para assegurar a autenticidade de uma procuração.
Por outro lado, a adesão à Convenção da Apostila de Haia simplifica os procedimentos burocráticos dos investidores estrangeiros para criar uma empresa brasileira, ou participar de uma empresa preexistente, facilita a atuação de empresas estrangeiras na validação de documentos para concorrências públicas, bem como a participação de empresas brasileiras no exterior.
Contudo, é importante salientar que nos termos do Decreto nº 8.660/2016, a Convenção somente entrará em vigor no plano jurídico externo em 14 de agosto de 2016. Com efeito, isso decorre da própria sistemática da Convenção que prevê que sua eficácia entre o Estado aderente e os Estados Signatários que não tiverem apresentado objeção à adesão, somente se iniciará no sexagésimo dia após a expiração do prazo de seis meses do envio de notificação pelo Ministério das Relações Exteriores dos Países Baixos sobre referida adesão.
No plano interno, a promulgação da Convenção entrou em vigor na data de publicação do Decreto nº 8.660/2016, em 29 de janeiro passado. A coordenação e regulamentação da aplicação da Convenção da Apostila de Haia foram delegadas para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tendo o seu presidente, Ministro Ricardo Lewandowski, instituído, por meio da Portaria 155/2015, um grupo de trabalho para desenvolver um sistema que permita emitir a apostile nos cartórios de todo país.
Por fim, vale lembrar que no caso específico da França, o Brasil já tinha firmado um precioso acordo com o governo francês, celebrado em 28 de maio de 1996 e promulgado por meio do Decreto nº 3.598, de 12 de setembro de 2000, mais vantajoso do que a Convenção por simplesmente abolir a chamada “consularização”, sem prever qualquer substituição ao contrário do que fez a Convenção com a criação da apostila (Acordo de Cooperação em Matéria Civil entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Francesa, celebrado em Paris).
¹Para uma lista completa, consultar a seguinte página: https://www.hcch.net/pt/instruments/conventions/status-table/?cid=41.
² Os documentos emitidos por agentes diplomáticos ou consulares e os documentos administrativos diretamente relacionados a operações comerciais ou aduaneiras foram expressamente excluídos do âmbito da aplicação da Convenção (Art. 1º).